Decisão TJSC

Processo: 5003433-92.2021.8.24.0018

Recurso: EMBARGOS

Relator: Desembargadora DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI

Órgão julgador: Turma, j. 13-3-2023).

Data do julgamento: 16 de março de 2015

Ementa

EMBARGOS – Documento:7059408 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Nº 5003433-92.2021.8.24.0018/SC RELATORA: Desembargadora DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI RELATÓRIO Cuida-se de embargos de declaração opostos por E. B. contra o acórdão do evento 21.1, assim ementado: APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SERVIDOR PÚBLICO (CHEFE DO SETOR OPERACIONAL DE ESGOTO) DA CASAN QUE COBRARIA PROPINA PARA PERMITIR O ACESSO ÀS ESTAÇÕES DE TRATAMENTO DE ESGOTO (ETE'S), ALÉM DE NÃO REPASSAR OS VALORES DEVIDOS À CASAN PELA TAXA DE SERVIÇO. SENTENÇA de PARCIAL PROCEDÊNCIA PELA PRÁTICA DOS ATOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 9, INCISO I, E 10, INCISO II, DA LEI DE IMPROBIDADE.

(TJSC; Processo nº 5003433-92.2021.8.24.0018; Recurso: EMBARGOS; Relator: Desembargadora DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI; Órgão julgador: Turma, j. 13-3-2023).; Data do Julgamento: 16 de março de 2015)

Texto completo da decisão

Documento:7059408 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Nº 5003433-92.2021.8.24.0018/SC RELATORA: Desembargadora DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI RELATÓRIO Cuida-se de embargos de declaração opostos por E. B. contra o acórdão do evento 21.1, assim ementado: APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SERVIDOR PÚBLICO (CHEFE DO SETOR OPERACIONAL DE ESGOTO) DA CASAN QUE COBRARIA PROPINA PARA PERMITIR O ACESSO ÀS ESTAÇÕES DE TRATAMENTO DE ESGOTO (ETE'S), ALÉM DE NÃO REPASSAR OS VALORES DEVIDOS À CASAN PELA TAXA DE SERVIÇO. SENTENÇA de PARCIAL PROCEDÊNCIA PELA PRÁTICA DOS ATOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 9, INCISO I, E 10, INCISO II, DA LEI DE IMPROBIDADE. RECURSO DO RÉU.  1) PRELIMINARES. 1.1) CERCEAMENTO DE DEFESA PELA AUSÊNCIA DE INTERROGATÓRIO DO RÉU. REJEIÇÃO. DIREITO À INTERROGATÓRIO DO RÉU SE TRADUZ EM MERA ESTRATÉGIA DE DEFESA E NÃO OBRIGAÇÃO PROCESSUAL. PRECEDENTES. HIPÓTESE, ADEMAIS, EM QUE HOUVE A DISPENSA DA OITIVA PELO PROCURADOR DO RÉU. PRECLUSÃO. 1.2) NULIDADE DA PROVA EXTRAÍDA DA APREENSÃO DOS CELULARES DE EMPRESÁRIOS ENVOLVIDOS. VÍCIO NÃO CONSTATADO. PROVA EMPRESTADA DA ESFERA PENAL. EVENTUAL DISCUSSÃO SOBRE A VALIDADE QUE DEVE RECAIR SOBRE O FEITO ORIGINÁRIO.  2) MÉRITO. 2.1) AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. ALEGAÇÃO DE QUE AS COBRANÇAS TRATAVAM DE EMPRÉSTIMOS PESSOAIS. SEM RAZÃO. ARCABOUÇO PROBATÓRIO ROBUSTO QUE CONTA COM CONVERSAS, COMPROVANTES DE PAGAMENTO E DEPOIMENTO TESTEMUNHAL. EXIGÊNCIA DE VANTAGEM INDEVIDA QUE, POR SI SÓ, PRESSUPÕE VONTADE CONSCIENTE E DELIBERADA DE OBTER BENEFÍCIO ILÍCITO, MEDIANTE ABUSO DA POSIÇÃO PÚBLICA OCUPADA. DOLO EVIDENCIADO. 2.2) TENTATIVA DE DESCREDIBILIZAÇÃO DA TESTEMUNHA PRINCIPAL E TAMBÉM DA PRÓPRIA CASAN. REJEIÇÃO. DEPOIMENTO CORROBORADO POR DIVERSAS PROVAS DOCUMENTAIS. EVENTUAL PRECARIEDADE ESTRUTURAL QUE NÃO EXIME O AGENTE PÚBLICO DO DEVER DE LEGALIDADE E PROBIDADE. 2.3) REDUÇÃO DAS SANÇÕES. INVIABILIDADE. SENTENÇA ADEQUADA À GRAVIDADE DO CASO. CONSIDERADO O DANO EFETIVAMENTE COMPROVADO. PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA JUSTIFICADA PELA DESONESTIDADE E INCOMPATIBILIDADE COM OS VALORES MORAIS DO SERVIÇO PÚBLICO.  RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. O embargante alega que o acórdão padece de omissões e contradições diversas. Reitera que a dispensa do interrogatório do réu sem anuência do procurador, viola o contraditório e ampla defesa e que nunca anuiu com a dispensa. Diz que a apreensão de celulares sem ordem judicial e sem perícia, compromete a validade das mensagens utilizadas, e que a decisão não enfrentou a ilegalidade. Arguiu omissões e contrariedades nas provas, ao passo em que não indica a comprovação de pagamentos ilícitos, depósitos ou associação criminosa; diz que o controle de acesso à ETE contém imagens sem prova de beneficiários ou entrada efetiva dos caminhões; alega que conversas apagadas foram tratadas como ocultação de provas sem conteúdo recuperado; que foi ignorada a confissão de despejos indevidos por terceiro e existência de outros locais para descarte; que permutas por serviços emergenciais não configuram improbidade, mas mera prática irregular; que a responsabilização pela desorganização administrativa sem indicar grau de responsabilidade ou provas de orientação para pagamentos em espécie configura omissão; que a suposta obstrução de investigações e ameaças a testemunhas contradizem absolvição criminal e depoimentos que negam intimidação. Ao final, contesta o cálculo do dano ao erário (R$ 12.000,00), por ausência de referência nos autos (evento 32.1). Este é o relatório. VOTO Admissibilidade Os embargos declaratórios destinam-se ao aperfeiçoamento da decisão recorrida para sanar eventual omissão, contradição, obscuridade ou corrigir erro material (art. 1.022 do CPC). Tais hipóteses servem de limite ao seu efeito devolutivo, pois a matéria suscitada não pode ser objeto de nova análise pelo órgão que prolatou a decisão. Nesses termos, preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço dos aclaratórios. Destaca-se, desde logo, que não há prejuízo na ausência de intimação da parte embargada pois não trata-se de reclamo dotado de efeitos infringentes. Contradição: cerceamento de defesa – ausência de interrogatório Nos embargos, o réu sustenta que houve cerceamento de defesa porque seu interrogatório foi dispensado sem anuência do procurador, violando o contraditório e a ampla defesa. Afirma que a ata da audiência não registra consentimento da defesa. Por primeiro, merece mesmo correção o trecho do acórdão em que consta que na ata da audiência (evento 252.1), a oitiva do réu teria sido dispensada com a anuência do procurador. No documento consta tão somente a sua dispensa, e, em ato seguinte, na ocasião de alegações finais,  o réu reiterou o interesse na oitiva, o que reforça que ocorreu sem a sua anuência.  Entretanto, a não realização da oitiva, por si só, não acarreta cerceamento de defesa e o acórdão embargado bem refuta essa alegação. Explica que o interrogatório é faculdade da parte, não imposição legal, conforme art. 385 do CPC e art. 17, §18, da Lei de Improbidade. Desse modo, fica claro que a ausência do ato não gera nulidade, pois não há obrigação legal nesse sentido. Veja-se: 2.1 Por primeiro, o réu sustenta a existência de cerceamento de defesa, sob o fundamento de que não houve a realização de seu interrogatório, razão pela qual pugna pelo retorno dos autos à origem para que o ato seja realizado, com posterior novo julgamento. Entretanto, tal alegação não merece prosperar.  A Lei assegura ao réu o direito de ser interrogado, mas não estabelece obrigatoriedade de que o magistrado determine a realização desse ato de ofício, tampouco prevê nulidade em caso de sua ausência. Extraio da Lei de Improbidade: Art. 17. A ação para a aplicação das sanções de que trata esta Lei será proposta pelo Ministério Público e seguirá o procedimento comum previsto na Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), salvo o disposto nesta Lei.     [...] § 18. Ao réu será assegurado o direito de ser interrogado sobre os fatos de que trata a ação, e a sua recusa ou o seu silêncio não implicarão confissão Como visto, o art. 17, caput, da Lei de Improbidade Administrativa estabelece que o procedimento aplicável às ações dessa natureza será o comum previsto no Código de Processo Civil, salvo as exceções expressamente previstas na referida lei. No que toca ao interrogatório das partes, o art. 385 do CPC dispõe que cabe à parte requerer o depoimento pessoal da outra, sendo que o juiz pode, por sua iniciativa, determinar o ato, mas não está vinculado a fazê-lo. Dessa forma, o interrogatório assume natureza de faculdade e não de imposição. Veja: Art. 385. Cabe à parte requerer o depoimento pessoal da outra parte, a fim de que esta seja interrogada na audiência de instrução e julgamento, sem prejuízo do poder do juiz de ordená-lo de ofício. § 1º Se a parte, pessoalmente intimada para prestar depoimento pessoal e advertida da pena de confesso, não comparecer ou, comparecendo, se recusar a depor, o juiz aplicar-lhe-á a pena. § 2º É vedado a quem ainda não depôs assistir ao interrogatório da outra parte. § 3º O depoimento pessoal da parte que residir em comarca, seção ou subseção judiciária diversa daquela onde tramita o processo poderá ser colhido por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, o que poderá ocorrer, inclusive, durante a realização da audiência de instrução e julgamento. Assim, o §18 do art. 17 da Lei nº 8.429/92 não alterou a essência do instituto, limitando-se a assegurar que o réu poderá exercer o direito de ser interrogado. Assim, o dispositivo apenas reforça a possibilidade de o réu requerer o interrogatório, sem impor ao juiz o dever de realizá-lo.  É, portanto, uma estratégia de defesa, cujo não exercício não presume prejuízo ao réu. Desse modo, reconheço o equívoco para corrigir a parte onde consta que a oitiva foi dispensada com a anuência do procurador, contudo, sem efeitos infringentes, porquanto bem afastada a tese de cerceamento de defesa. Contradição: nulidade da apreensão dos celulares Nos embargos, o réu alega contradição e omissão quanto à validade da apreensão dos celulares, afirmando que a ordem judicial abrangia apenas seu aparelho, não os de terceiros, e que houve acesso irregular sem perícia. Contudo, o acórdão esclarece que a busca e apreensão do celular do réu foi judicialmente autorizada no processo criminal 5015863-13.2020.8.24.0018, com decisão fundamentada. Quanto aos aparelhos dos empresários, ficou comprovado que houve entrega voluntária, sem indícios de coação ou vício de consentimento. Ademais, as mensagens não foram analisadas isoladamente, mas corroboradas por extratos, imagens de videomonitoramento e depoimentos, formando um conjunto probatório sólido. Reitero a fundamentação: 2.2 A alegação de nulidade da apreensão dos aparelhos celulares, suscitada pela defesa em sede preliminar, também não merece prosperar. A medida em questão foi deferida pelo juízo competente no processo de Busca e Apreensão Criminal n. 5015863-13.2020.8.24.001, com decisão fundamentada e dentro dos limites legais. Nestes autos, a prova figura apenas na condição de emprestada, motivo pelo qual qualquer questionamento sobre sua validade deve ser adstrito ao feito originário, não havendo espaço para sua discussão aqui. Demais disso, no tocante aos aparelhos pertencentes aos empresários, restou demonstrado que o acesso foi franqueado de forma voluntária por seus titulares à autoridade policial. Também não há indício de coação, ameaça ou vício de consentimento que macule a entrega dos dispositivos. Pelo contrário, os depoimentos colhidos em juízo confirmam que os empresários colaboraram espontaneamente com a investigação, reforçando a legitimidade da medida. Ressalte-se, ainda, que os dados obtidos dos celulares — em especial as mensagens de WhatsApp — não foram analisados de forma isolada pelo juízo sentenciante, mas confrontados e confirmados por outras provas independentes, como extratos bancários, depoimentos testemunhais e registros de videomonitoramento. Tal circunstância, por si só, afasta a alegação de eventual contaminação probatória, uma vez que o conjunto de elementos probatórios se mostra coerente, convergente e apto a embasar a condenação. Dessa forma, não há nulidade a ser reconhecida. A apreensão e a análise dos aparelhos celulares observaram os ditames legais e processuais, e o material colhido se soma às demais provas produzidas, compondo um arcabouço probatório sólido e suficiente para a manutenção da condenação. A preliminar, portanto, deve ser rejeitada. Assim, não há nulidade a reconhecer. Omissões e contradições: alegação de ausência de dolo e insuficiência probatória O embargante afirma que não houve dolo específico, sustentando que os valores recebidos seriam empréstimos pessoais, e que não há prova cabal do esquema, bem como, que o acórdão é omisso pois não detalha nomes, valores e o modus operandi do suposto esquema. Os vícios não se verificam. O acórdão é categórico ao concluir que o réu exigia vantagem indevida para permitir acesso à ETE, o que configura enriquecimento ilícito (art. 9º, I, LIA) e prejuízo ao erário (art. 10, II, LIA). Desse modo, o dolo é inequívoco, pois a exigência de propina pressupõe vontade consciente e deliberada de obter benefício ilícito mediante abuso da função pública. Quanto ao esquema, o acervo probatório é robusto e amplamente listado em toda a fundamentação do acórdão. A fim de evitar tautologia, replico: 3.1 Em breve e necessária introdução ao caso dos autos, o Ministério Público narra que, E. B., então chefe do Setor Operacional de Esgoto da CASAN em Chapecó, começou a arquitetar um esquema de corrupção em que cobrava propina de empresas de coleta de esgoto para permitir o descarte de efluentes na Estação de Tratamento da CASAN sem o pagamento da taxa oficial ("conta serviço"). As empresas deveriam pagar R$ 159,06 por carga mínima de 6m³, mas Edinilson exigia valores entre R$ 50,00 e R$ 100,00 por carga diretamente a ele. Em troca, liberava o acesso à estação, inclusive fora do horário comercial, entregando cópias da chave do cadeado do portão de entrada. Após denúncia anônima, a Polícia Civil iniciou investigações. Teria sido constatado que, em junho de 2020, 124 caminhões acessaram a estação, mas apenas 47 pagamentos foram registrados, indicando 77 despejos irregulares. A investigação reuniu imagens de câmeras, extratos bancários, conversas de WhatsApp e depoimentos de testemunhas como Thiago Marcon, que afirmou ter pago propina mais de cem vezes, e que sofreu ameaças por tentar seguir o procedimento legal. Nesse viés, Edinilson controlava o acesso à estação, liberando a entrada mediante propina. Os caminhões entravam pela "Entrada 2", sem controle efetivo, e usavam guias repetidas ou falsificadas para justificar os despejos. Diversas empresas participaram do esquema, como Papa Tudo, Limpa Fossa Catarinense, Disk Entulho Xaxim, Casa do Socorro e Desentupidora Chapecó. Algumas negaram envolvimento, mas foram contraditas por provas documentais e testemunhais. Segundo o MPSC, teria sido comprovado o recebimento de pelo menos R$ 3.000,00 em propinas, sendo R$ 2.100,00 via transferências bancárias da empresa Agro Prestadora de Serviços Ltda. e R$ 900,00 em espécie por Cláudio Antunes. O esquema causou prejuízo direto à CASAN, estimado em pelo menos R$ 12.000,00 apenas no mês de junho de 2020, além de danos à imagem da empresa e à regularidade dos serviços públicos. Para o MPSC, Edinilson agiu com dolo, consciente da ilicitude de seus atos. Além de cobrar propina, ameaçava empresários que tentavam seguir o procedimento legal, como no caso de Thiago Marcon, que, segundo relatou, chegou a usar colete à prova de balas por medo do réu. Diante das provas colhidas na investigação, o MP requereu a condenação de E. B. por improbidade administrativa, com perda da função pública, ressarcimento ao erário, multa civil e indenização por dano moral coletivo no valor mínimo de R$ 100.000,00. 3.2 As condutas foram reconhecidas pelo juízo sentenciante, cujas bem lançadas razões na análise do conjunto probatório (que é robusto), merecem ser repisadas e adotadas como fundamentos para este acórdão: Edinilson é empregado da Cia Catarinense de Águas e Saneamento (CASAN) desde 08.11.2006, admitido mediante concurso público para o cargo de Instalador Hidráulico/Sanitário (Evento 1, Anexo 15). Desde 2015 foi nomeado seguidas vezes para a função de "Chefe do Setor Operacional de Esgoto – SEOPE" da Agência de Chapecó. Sua última nomeação se estendeu de 20.04.2020 a 22.01.2021 (Evento 1, Anexos 17-20). Em 16.07.2020 a 5ª Delegacia de Combate à Corrupção (DECOR) recebeu denúncia anônima repassada pela Delegacia de Investigação Criminal (DIC), segundo a qual o réu estaria envolvido em esquema criminoso. Segundo a investigação, Edinilson exigia, em tese, o pagamento de propina das empresas desentupidoras e limpa fossas da região de Chapecó, a fim de permitir o descarte de dejetos na Estação de Tratamento de Efluentes (ETE) sem o pagamento da guia de recolhimento denominada "Conta Serviço". Com isso visto, consigna-se, em primeiro lugar, que o descarte de efluentes na ETE é uma prática lícita, autorizada no Edital de Credenciamento de Descarte da CASAN, o qual disciplina "o credenciamento de empresas prestadoras de serviço de coleta de efluentes provenientes de limpeza de fossas e banheiros químicos, para descarte nas unidades de tratamento de esgoto da CASAN no Estado de Santa Catarina; e procedimentos para descarte de dejetos provenientes de veículos 'motorhome' e de ônibus de turismo" (Evento 1, Anexo 5, p. 26-45). Contudo, a CASAN exige, para tal, o credenciamento do veículo que realizará o descarte, assim como o pagamento prévio de uma guia "Conta Serviço" para cada descarga, calculada em R$ 26,51 o m³ e com valor mínimo de R$ 159,06 (item 6 do Edital): 6. DO PREÇO E PAGAMENTOS PRATICADOS 6.1. O preço unitário proposto para o despejo dos efluentes será de R$ 26,51 (vinte e seis reais e cinquenta e um centavos) por metro cúbico (m³) de despejo proveniente de banheiro químico e efluentes de caminhão limpa-fossa. 6.2. O valor a ser pago será equivalente ao volume do tanque do caminhão que se apresentar para o despejo, sendo que o valor mínimo a ser cobrado será de R$ 159,06 (cento e cinquenta e nove reais e seis centavos) correspondente a 6 m³ (seis metros cúbicos). 6.3. O pagamento deverá ser efetuado à CASAN, anteriormente ao despejo dos efluentes na ETE. A contratante deverá comparecer no atendimento da CASAN para retirar a fatura “Conta Serviço” (Anexo V) correspondente ao volume de efluentes a serem despejados na ETE. 6.4. Cada “Conta Serviço” deverá ser no quantitativo de efluentes correspondente à capacidade do caminhão/tanque a ser despejado, ou seja, cada carga referente à capacidade do tanque deverá ser pertinente a uma única “Conta Serviço”. 6.5. Não poderá ser emitida nova fatura “Conta Serviço” caso tenha alguma fatura pendente. Após ser notificada no Inquérito Policial, a CASAN apresentou o total de guias "Conta Serviço" emitidas em junho de 2020. Formalmente, no referido mês 5 empresas solicitaram a emissão de 30 guias, das quais 26 foram quitadas (Evento 1, Anexo 2, p. 9-38): Ocorre que, como constou no Relatório de Investigação 1/2020 e no Ofício 8/2020/BLOR, as imagens de câmera de segurança próxima à ETE demonstraram que houve fluxo de quantia muito superior de veículos em relação às guias emitidas (Evento 1, Anexo 2, p. 39-61). O confronto entre os referidos documentos e as imagens acostadas no Evento 1, Anexos 5-13, ilustra o tráfego de pelo menos 15 caminhões de 10 empresas diferentes, os quais adentraram o caminho à ETE por ao menos 120 vezes entre 04.06.2020 e 30.06.2020: Logo, há diferença de 5 empresas e de 94 descargas em relação ao número total de guias emitidas. Em relação à higidez das referidas imagens, nota-se que o relatório de Investigação 1/2020 demonstrou que a estrada filmada é um caminho sem saída que leva a somente dois lugares, quais sejam, a usina de asfalto e britagem do Município de Chapecó e a Estação de Tratamento de Efluentes da CASAN (Evento 1, Anexo 7, p. 4-14): A testemunha Viviane acrescenta que a estrada também leva a um local de descarte de galhos e há controvérsia sobre tal estrada também levar até um rio. Não obstante, é claramente perceptível que o único destino para o qual os caminhões poderiam ir era de fato a ETE. Em primeiro lugar, é preciso destacar que a Estação de Tratamento de Efluentes (ETE) da CASAN é o único local abrangido pela referida estrada que é destinado a caminhões de coleta e despejo de efluentes. É muito pouco crível que tantos caminhões tenham se deslocado tantas vezes à usina de asfalto municipal, a um local de descarte de galhos ou ao leito do rio, afinal, são locais totalmente impróprios ao descarte de efluentes. Em segundo lugar, mesmo que se admitisse a alegação que alguns caminhões estavam fazendo o descarte de efluentes no rio, é igualmente pouco crível que isso tenha ocorrido tantas vezes, por tantas empresas diferentes. Isso justamente no trajeto para uma estação de tratamento de efluentes, a qual todos os empresários ouvidos admitiram que utilizavam (muito dos quais disseram que nem mesmo chegaram a ir além da ETE). Em terceiro lugar, os testigos Thiago e Sedenir deixam claro que o fim do trajeto nem mesmo chega ao leito do rio, de modo que os caminhões não conseguem alcançar o rio para fazer esse descarte. Além de que não há qualquer registro fotográfico de que o trajeto realmente forneça acesso ao leito do rio. Inclusive, os depoentes Delvino, Viviane, Thiago, Sedenir, Marcos e Vanderlei esclareceram que o único local para o qual os caminhões iam era de fato a ETE. Nenhuma testemunha confirmou explicitamente a tese de que eram feitos descartes no rio. Em quarto lugar, mesmo que se admita que realmente havia acerto verbal entre Edinilson e as empresas para a permuta de descargas por serviços emergenciais prestados à CASAN, não é plausível que isso tenha ocorrido em tantas ocasiões em um único mês; sobretudo ao considerar que as testemunhas são unânimes no sentido de que os referidos serviços emergenciais aconteciam esporadicamente e davam direito a, no máximo, duas ou três descargas. Seja como for, nota-se que os depoimentos colhidos no Inquérito Policial e perante este Juízo, assim como os extratos das conversas promovidas via aplicativo de mensagem (cuja colheita foi autorizada pelos interlocutores em parte e por decisão judicial em outra), corroboram a alegação inicial acerca da exigência (ou ao menos solicitação) de valores para autorização de acesso à ETE sem o pagamento da guia "Conta Serviço". Inicialmente, chama atenção o depoimento prestado por Thiago Marcon no Inquérito Policial (Evento 3, Anexo 5) e o testemunho prestado por ele perante este Juízo (Evento 23, Anexos 5-8). Em ambas as ocasiões houve o relato de que Edinilson começou a exigir um "cachê" para liberar o acesso até a ETE. Havia a cobrança de R$ 50,00 por descarga para os caminhões pequenos e R$ 100,00 por descarga para os caminhões maiores (valores inferiores àqueles cobrados pela CASAN). Edinilson fornecia a chave do portão para a ETE aos pagantes, os quais podiam acessar o local mesmo fora do horário comercial. Os pagamentos eram feitos geralmente em espécie, em local isolado previamente combinado. Se não houvesse pagamento da vantagem ao próprio Edinilson, ele barrava as descargas ou colocava outros caminhões na frente. O esquema iniciou entre 2018 e 2019 e perdurou por cerca de um ano e meio, até o momento em que Edinilson tomou conhecimento que foram iniciadas as investigações. Embora haja um debate sobre uma relação de inimizade entre o testigo Thiago Marcon e o réu E. B., a prova dos autos indica que a desavença iniciou justamente em razão dos fatos aqui em discussão. Além disso, o modus operandi descrito por Thiago é corroborado por várias das conversas colhidas durante a investigação, especialmente, aquelas expostas no Relatório de Investigação 2/2020 (Evento 1, Anexo 7, p. 15-44). Em uma das conversas Edinilson cobra a realização de um acerto e, inclusive, repassa os dados de conta bancária para o depósito dos valores do acerto (Evento 1, Anexo 7, p. 22): Em outra conversa Edinilson diz que não aceita mais depósitos em conta bancária, porque acha muito arriscado e presume que "tem muita gente de olho". Inclusive admite ter consciência que a prática é ilícita, na medida em que afirma que, se alguém descobrir, irá ser sancionado (Evento 1, Anexo 7, p. 22): E até mesmo cobra que os pagamentos sejam realizados de forma rigorosa (Evento 1, Anexo 7, p. 34): Refere que está anotando as descargas na sua agenda, para fins de controle dos pagamentos (Evento 1, Anexo 7, p. 35): Em uma conversa deixa claro que exige as guias apenas de forma esporádica, mas impreterivelmente às quintas-feiras (Evento 1, Anexo 7, p. 33): Além disso, há demonstração de depósitos bancários realizados para o réu por uma das empresas (Agro Prestadora de Serviços Ltda ME). A título de exemplo, no Relatório de Investigação 6/2020 foram identificados 4 depósitos feitos entre 25.10.2018 e 1º.01.2020, os quais totalizaram R$ 2.100,00 (Evento 1, Anexo 9, p. 17-21): As operações são confirmadas em relatório consolidado produzido pelo Laboratório de Tecnologia Contra Lavagem de Dinheiro da Polícia Civil de Santa Catarina (LAB-LD), o qual foi juntado no Evento 1, Anexo 13, p. 166-225 destes autos. Não bastasse a prova farta acerca das cobranças, há evidências de tentativas do réu de frustrar a investigação. O primeiro indício foi a exclusão das mensagens realizadas por WhatsApp com todos os empresários, como destaca o Relatório de investigação 3/2020 (Evento 1, Anexo 4, p. 21-23). As mensagems deletadas são irrecuperáveis, como é detalhado no Laudo Pericial 9118.20.01868 – Caso 2020.22.2834, lavrado pelo Instituto Geral de Perícias (IGP) em 04.12.2020 (Evento 1, Anexo 4, p. 39-56). Não há como cogitar a inexistência de tais conversas, afinal, colhe-se dos extratos do Evento 1, Anexo 13, p. 15-160, uma plêiade de conversas. Além disso, há um diálogo em que o réu e um terceiro até mesmo combinam uma retaliação em desfavor de Thiago (o vulgo "barriga de cobra"), provavelmente em razão das desavenças acima. O objetivo dos interlocutores é encontrar uma forma de denunciar Thiago (Evento 1, Anexo 13, p. 143): Embora a defesa alegue a nulidade da colheita dos celulares dos empresários pelo Delegado de Polícia (o que está sendo discutido nos autos da Ação Penal 5003432-10.2021.8.24.0018), destaca-se que as conversas são analisadas para corroborar todo o plexo probatório produzido, notadamente as guias juntadas pela CASAN e as imagens da câmera de videomonitoramento. Além disso, não há (ao menos nesta ação civil) demonstração que o acesso às conversas tenha sido obtido de forma irregular. Em primeiro lugar porque o acesso aos celulares do réu Edinilson foi autorizado judicialmente na Busca e Apreensão Criminal 5015863-13.2020.8.24.0018 (Evento 1, Anexo 2, p. 62-65). Em segundo lugar porque o acesso aos celulares dos empresários foi franqueado por eles próprios ao Delegado de Polícia, após serem informados em relação aos seus direitos constitucionais, sem prova robusta de coação (Evento 1, Anexo 3, e Eventos 2-3). De qualquer sorte como as mensagens não mencionam valores, elas não serão consideradas para fins de quantificação do valor do dano; mas apenas para corroborar as demais provas produzidas (em especial, os extratos de depósitos bancários, as guias apresentadas pela CASAN e as imagens de videomonitoramento), as quais trazem indícios suficientes da prática do ato ímprobo. 3.3 Pois bem. A controvérsia recursal no mérito gira em torno da alegação de que os fatos narrados não configurariam atos de improbidade administrativa, sob a justificativa de ausência de dolo específico, insuficiência probatória, falhas administrativas da CASAN e suposta relação privada entre o réu e uma das testemunhas. No entanto, tais argumentos não se sustentam diante do conjunto probatório robusto, coerente e convergente que embasa a sentença de parcial procedência. Ao exigir ou receber vantagem indevida para permitir o acesso à Estação de Tratamento de Efluentes (ETE) da CASAN, o réu incorreu em enriquecimento ilícito, nos termos do art. 9º, inciso I, da Lei de Improbidade: Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando em enriquecimento ilícito auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente:         I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público; Simultaneamente, ao permitir o descarte de efluentes sem o pagamento das guias de “Conta Serviço”, causou prejuízo direto ao erário da sociedade de economia mista, configurando a conduta prevista no art. 10, inciso II, da mesma lei: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; Exigir propina como condição para permitir o acesso a espaço público, valendo-se do cargo e da autoridade conferida pela função pública, evidencia de forma inequívoca o dolo específico do agente. Isso porque não há como incorrer em tal conduta de maneira inadvertida ou culposa: a exigência de vantagem indevida pressupõe vontade consciente e deliberada de obter benefício ilícito, mediante abuso da posição pública ocupada. Trata-se, portanto, de ato que, por sua própria natureza, revela a intenção de enriquecimento ilícito e de afronta aos princípios da Administração Pública. Assim, não prospera a tese de ausência de prova do dolo específico. Adiante, a tese defensiva de que os valores recebidos decorrem de relação privada com a testemunha Thiago Marcon — envolvendo suposta venda de veículo ou empréstimo pessoal — não encontra respaldo nos autos. Os depósitos bancários identificados, bem como os pagamentos em espécie, estão diretamente vinculados à função pública exercida pelo réu, conforme demonstrado por provas documentais e testemunhais. Deste modo, a tentativa de descredibilizar a testemunha Thiago Marcon também não prospera. Seu depoimento foi corroborado por diversos elementos da investigação, como: I) Mensagens de WhatsApp entre o réu e empresários, revelando o modus operandi do esquema, com exigência de pagamentos, marcação de encontros em locais isolados e fornecimento de dados bancários; II) Depoimentos de empresários que confirmam o pagamento de valores inferiores aos oficiais, em espécie, para liberação de cargas sem guia e fora do horário comercial; III) Extratos bancários que comprovam quatro depósitos da empresa Agro Prestadora de Serviços Ltda., totalizando R$ 2.100,00, sem justificativa plausível; IV) Controle de acesso à ETE fornecido pelo próprio réu, registrando apenas 47 descarregamentos em junho de 2020, enquanto imagens da câmera de segurança registraram 124 passagens de caminhões limpa fossa; V) Conversas apagadas do celular funcional e pessoal do réu, conforme laudo pericial, indicando tentativa de ocultação de provas. Ainda, a alegação de que os caminhões poderiam ter outro destino, como o rio ou a usina de britagem, foi refutada por testemunhas e pela própria lógica dos fatos. A estrada filmada é um caminho sem saída, cujo único destino viável para caminhões de coleta de efluentes é a ETE da CASAN. Nenhuma testemunha confirmou descarte no rio, e não há registro fotográfico que comprove tal hipótese - assim, a mera alegação do réu não se sustenta. Também a justificativa de que os valores recebidos seriam decorrentes de “permutas” por serviços emergenciais não se sustenta. Não há qualquer contrato, autorização ou previsão legal que ampare essa prática. Os serviços emergenciais eram esporádicos e não justificam o volume de cargas descarregadas sem guia, conforme demonstrado pelas imagens e registros oficiais. A existência de alguma desorganização administrativa da CASAN tampouco afasta a responsabilidade do réu. Isso porque, a precariedade estrutural não exime o agente público do dever de legalidade e probidade, especialmente quando há prova de que o réu agia conscientemente para burlar o sistema de controle, orientando empresários a realizar pagamentos em espécie e evitando depósitos bancários por serem “arriscados”. A tese de ausência de dolo também não se sustenta. O elemento subjetivo está demonstrado de forma clara e reiterada nos autos, inclusive pela tentativa de obstrução das investigações, com exclusão de mensagens e ameaças à testemunha que colaborava com a apuração. O réu tinha plena ciência da ilicitude de sua conduta e agiu deliberadamente para ocultá-la. Por todo o exposto, concluo que o apelante exigiu vantagem indevida para permitir descarte de efluentes sem pagamento da taxa à CASAN, conduta que configura enriquecimento ilícito (art. 9º, I) e prejuízo ao erário (art. 10, II da LIA). Além disso, nos embargos, o réu sustenta que o acórdão ignorou contradições e provas que fragilizariam o depoimento de Thiago Marcon. Contudo, o acórdão afirma que o depoimento foi coerente e corroborado por provas documentais e periciais, enquanto que a alegação de relação privada (empréstimos) não encontra respaldo nos autos. Do mesmo modo, a possibilidade de descarte em rio ou usina de britagem (outros caminhos possíveis além da ETE) também não encontra qualquer correspondência probatória. A tese é inverossímil diante da lógica dos fatos e dos depoimentos colhidos. Nos embargos também se sustenta que as descargas sem guia ocorreram por permutas, não por propina. De todo modo, não há contrato ou previsão legal que ampare essa prática. Além disso, os serviços emergenciais eram esporádicos e não justificam 94 descargas sem guia em um único mês. A alegação não afasta a ilicitude, mas reforça a propensão à prática de condutas fora dos ditames legais. No mais, quanto ao controle da CASAN, o acórdão é claro: a precariedade estrutural não exime o agente público do dever de legalidade e probidade. Pelo contrário, há prova de que o réu agia para burlar controles. Nesse aspecto, a natureza da função pública, por sua própria essência, é pautada pela confiança que a Administração e a sociedade depositam no agente público para o exercício ético, probo e responsável de suas atribuições. Tal função se rege pelos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (art. 37, caput, da CF), que impõem ao servidor o dever de agir com lealdade institucional e respeito ao interesse público. A violação desses deveres, especialmente quando decorrente de conduta desonesta ou abusiva, configura quebra da confiança inerente ao cargo e afronta direta aos pilares da Administração Pública, legitimando o reconhecimento da prática de ato de improbidade administrativa. Pelo exposto, o acórdão está suficientemente fundamentado e não merece maiores esclarecimentos. Aliás, o pedido do embargante expressa meramente o inconformismo com o resultado da demanda, pois a reanálise do conjunto fático-probatório não é cabível em sede de embargos de declaração, uma vez que tal recurso possui finalidade estritamente delimitada pelo art. 1.022 do CPC, restringindo-se à correção de vícios formais da decisão, como omissão, contradição, obscuridade ou erro material. Assim, não se presta o manejo dos embargos como meio de rediscutir provas, reapreciar elementos de convicção ou promover novo julgamento da causa, sob pena de desvirtuamento da sua função integrativa e de indevida utilização como sucedâneo recursal. Obscuridade: obstrução de investigações e ameaças O embargante defende que o acórdão sugere que a suposta exclusão de mensagens, como tentativa de obstrução da investigação, além de ameaças à testemunha seriam indícios de dolo e reitera que foi absolvido nos autos n. .5005106- 23.2021.8.24.0018, em que se discutia a prática do crime de ameaça.  A interpretação do recorrente está equivocada. Como dito, o acórdão é categórico ao concluir que o réu exigia vantagem indevida como condição para permitir o acesso à Estação de Tratamento de Esgoto (ETE), conduta que se amolda ao enriquecimento ilícito previsto no art. 9º, inciso I, e ao prejuízo ao erário descrito no art. 10, inciso II, ambos da Lei de Improbidade Administrativa. O dolo, portanto, é inequívoco, uma vez que a exigência de propina pressupõe vontade livre, consciente e deliberada de auferir benefício ilícito em razão do cargo, mediante abuso da função pública e afronta direta aos princípios que regem a Administração. Essa conclusão está clara do acórdão embargado: Isso porque não há como incorrer em tal conduta de maneira inadvertida ou culposa: a exigência de vantagem indevida pressupõe vontade consciente e deliberada de obter benefício ilícito, mediante abuso da posição pública ocupada. Trata-se, portanto, de ato que, por sua própria natureza, revela a intenção de enriquecimento ilícito e de afronta aos princípios da Administração Pública. Assim, não prospera a tese de ausência de prova do dolo específico. Ademais, a absolvição do embargante na ação penal n. 5005106-23.2021.8.24.0018, que tratava do crime de ameaça, não guarda qualquer pertinência com os presentes autos, que versam sobre a prática de ato de improbidade administrativa, institutos de natureza e finalidades jurídicas diversas. A conclusão também está bem exposta na decisão: Considerando o que foi noticiado pelo réu no evento 15.1, atesto que nos autos criminais n. 5005106-23.2021.8.24.0018 foi reconhecida a absolvição do réu quanto ao delito de ameaça e coação no curso do processo, tal conclusão não interfere na análise do presente feito de improbidade administrativa. Isso porque aquela ação penal limitou-se à apuração de responsabilidade criminal por supostas ameaças dirigidas à testemunha Thiago Marcon, ainda que motivadas por sua atuação neste processo de improbidade  (processo 5005106-23.2021.8.24.0018/SC, evento 1, DOC1). Aqui, o objeto é diverso, voltado à verificação de condutas atentatórias à moralidade e à legalidade administrativas, de natureza cível e sancionatória própria, não havendo identidade de causa de pedir ou de pedidos entre as demandas capaz de gerar qualquer efeito vinculante. Demais disso, também foram juntados os vídeos da audiência instrutória que ocorreu no curso dos autos n. 5003432-10.2021.8.24.0018, estes ainda não sentenciados, em que se apura a prática de corrupção passiva. O réu apontou suposta relevância no depoimento de Gustavo Emanuel da Silva. Nesse aspecto, não verifiquei qualquer situação relevante, que fosse apta a ensejar a alteração do desfecho processual. A condenação do réu fundamentou-se em um conjunto probatório coeso e convergente, composto por mensagens extraídas de aplicativos de comunicação, nas quais o acusado solicita depósitos e admite a ilicitude de sua conduta; extratos bancários que evidenciam transferências realizadas por empresa beneficiada; imagens de videomonitoramento que demonstram o acesso reiterado de caminhões à ETE sem a correspondente emissão de guias de pagamento; além de depoimentos testemunhais que confirmam o modus operandi da cobrança de propinas. Sem prejuízo à acusação, torna-se desnecessária a abertura de prazo para a manifestação do Ministério Público sobre as provas juntadas no evento 15. Pelo exposto, neste ponto também não existem vícios a serem sanados. Contestação do cálculo do dano O embargante questiona o valor de R$ 12.000,00 mencionado no acórdão, porque não encontraria respaldo na fundamentação. De fato, trata-se de erro material. O prejuízo total estimado seria de R$ 21.632,16, conforme consta nas tabelas apresentadas, sendo que em junho de 2020 alcançaria a monta de R$ 14.951,64. Assim, o acórdão merece reparo no ponto. Onde se lê: A materialidade do dano ao erário foi demonstrada com precisão, ao se calcular a diferença entre o número de guias pagas e o total de descargas realizadas, evidenciando prejuízo estimado em R$ 12.000,00 apenas no mês de junho de 2020. Leia-se: A materialidade do dano ao erário foi demonstrada com precisão, ao se calcular a diferença entre o número de guias pagas e o total de descargas realizadas, evidenciando o prejuízo total de R$ 21.632,16. Prequestionamento Finalmente, reputam-se prequestionados os artigos constitucionais e infraconstitucionais mencionados pelo recorrente, pois, embora o objeto da irresignação tenha sido adequadamente enfrentado e fundamentado, "o julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão" (STJ, AgInt no AREsp n. 2.166.615/RS, rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, j. 13-3-2023). DISPOSITIVO Ante o exposto, voto no sentido de conhecer e dar parcial provimento aos aclaratórios para sanar erros materiais, nos termos da fundamentação, sem atribuir-lhes efeitos infringentes. assinado por DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI, Desembargadora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7059408v18 e do código CRC 56fef180. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI Data e Hora: 14/11/2025, às 17:01:08     5003433-92.2021.8.24.0018 7059408 .V18 Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:43:12. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas Documento:7059409 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Nº 5003433-92.2021.8.24.0018/SC RELATORA: Desembargadora DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI EMENTA EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SERVIDOR PÚBLICO (CHEFE DO SETOR OPERACIONAL DE ESGOTO) DA CASAN QUE COBRARIA PROPINA PARA PERMITIR O ACESSO ÀS ESTAÇÕES DE TRATAMENTO DE ESGOTO (ETE'S), ALÉM DE NÃO REPASSAR OS VALORES DEVIDOS À CASAN PELA TAXA DE SERVIÇO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA PELA PRÁTICA DOS ATOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 9, INCISO I, E 10, INCISO II, DA LEI DE IMPROBIDADE. DECISÃO MANTIDA POR UNANIMIDADE PELO ÓRGÃO COLEGIADO. NOVA INSURGÊNCIA DO RÉU. 1) CONTRADIÇÃO. ALEGAÇÃO DE QUE NÃO HOUVE ANUÊNCIA DO RÉU NA DISPENSA DE SUA OITIVA. VÍCIO EVIDENCIADO. CORREÇÃO QUE NÃO CLAMA EFEITOS INFRINGENTES, SOBRETUDO QUANDO EXAUSTIVAMENTE SE DISCORREU NA DECISÃO EMBARGADA DA AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA PELA NEGATIVA DA OITIVA, ENQUANTO FACULDADE PROCESSUAL.  2) ALEGADAS DIVERSAS CONTRADIÇÕES, OMISSÕES, OBSCURIDADES E ERROS SOBRE A INTERPRETAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. PEDIDO PELO RECONHECIMENTO DA AUSÊNCIA DE DOLO.  SEM RAZÃO. MANIFESTA INSATISFAÇÃO COM O RESULTADO DA DEMANDA. REANÁLISE DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO NÃO É CABÍVEL EM SEDE DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, UMA VEZ QUE TAL RECURSO POSSUI FINALIDADE ESTRITAMENTE DELIMITADA PELO ART. 1.022 DO CPC, RESTRINGINDO-SE À CORREÇÃO DE VÍCIOS FORMAIS DA DECISÃO, COMO OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU ERRO MATERIAL. VÍCIOS NÃO EVIDENCIADOS. 3) CONTESTAÇÃO SOBRE O CÁLCULO DO DANO QUE NA FORMA APRESENTADA NÃO CORRESPONDERIA AO APURADO. COM RAZÃO. HIPÓTESE DE ERRO MATERIAL. VÍCIO CORRIGIDO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, SEM EFEITOS INFRINGENTES.  ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Câmara de Direito Público do decidiu, por unanimidade, conhecer e dar parcial provimento aos aclaratórios para sanar erros materiais, nos termos da fundamentação, sem atribuir-lhes efeitos infringentes, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Florianópolis, 13 de novembro de 2025. assinado por DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI, Desembargadora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7059409v4 e do código CRC db287955. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI Data e Hora: 14/11/2025, às 17:01:08     5003433-92.2021.8.24.0018 7059409 .V4 Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:43:12. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA FÍSICA DE 13/11/2025 Apelação Nº 5003433-92.2021.8.24.0018/SC INCIDENTE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RELATORA: Desembargadora DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI PRESIDENTE: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA PROCURADOR(A): ROGE MACEDO NEVES Certifico que a 5ª Câmara de Direito Público, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão: A 5ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER E DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS ACLARATÓRIOS PARA SANAR ERROS MATERIAIS, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO, SEM ATRIBUIR-LHES EFEITOS INFRINGENTES. RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI Votante: Desembargadora DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI Votante: Desembargador VILSON FONTANA Votante: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA ANGELO BRASIL MARQUES DOS SANTOS Secretário Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:43:12. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas